O Dilema do Prisioneiro
A Teoria do
Jogo
Você e seu cúmplice foram arrastados até a
delegacia de polícia e colocados em celas separadas. O promotor diz a você que a
polícia possui evidência suficiente para mandá-los para trás das grades por um ano,
mas não o bastante para uma condenação mais pesada. Porém, se você confessar e
concordar em depor contra seu cúmplice, você ficará livre por ter colaborado, e ele
irá para a cadeia por três anos. Já se ambos confessarem o crime, os tiras não
precisarão de sua cooperação e cada um sofrerá uma pena de dois anos. Você é levado
a acreditar que a mesma proposta está sendo feita ao seu parceiro. O que você faz?
Esta é uma versão simples do "dilema do prisioneiro", um problema famoso na
teoria do jogo, a matemática da decisão. (Existem outros dilemas na teoria do jogo, como
o "dilema da galinha", que veremos mais tarde.) Talvez você não tenha sido
preso nos últimos tempos e esteja se perguntando por que deveria se preocupar com isso.
Na verdade, não é preciso procurar muito longe para achar outros dilemas do prisioneiro
na vida diária. Se tiver chance, você fura uma fila? Qual é sua reação àquelas
insistentes campanhas de doação de sangue veiculadas em rádio e televisão? Você lida
com os seus problemas no escritório através da omissão ou da responsabilidade? Em cada
caso, você se defronta com um problema similar ao do prisioneiro: você realmente se sai
melhor ao optar pelo comportamento egoísta?
O dilema é que a escolha não pode ser feita no terreno puramente racional. Para ver o
porquê, vamos retornar ao nosso cenário inicial. Olhando por um lado, você se sai
melhor confessando mas, por outro lado, você se sai melhor ficando quieto. Aqui estão as
possibilidades organizadas em ordem:
|
Parceiro fica calado |
Parceiro confessa |
Você
fica calado |
1
ano para você |
3
anos para você |
|
1
ano para parceiro |
0
anos para parceiro |
Você
confessa |
0
anos para você |
2
anos para você |
|
3
anos para parceiro |
2
anos para parceiro |
Obviamente, para você, o melhor
resultado possível é você confessar e seu parceiro ficar calado. (Na linguagem da
teoria do jogo, salvar sua própria pele, sem se importar com mais nada, é chamado
"defecção".) E até mesmo se seu parceiro confessar, você ainda lucra por
defectar, já que, se permanecer em silêncio, você pegará três anos de cadeia,
enquanto que confessando você só vai pegar dois. Em outras palavras, seja qual for a
opção do seu parceiro (e você não tem jeito de saber a decisão dele), você se sai
melhor defectando.
Porém, se seu parceiro for tão esperto quanto você, ele vai chegar à mesma conclusão:
a escolha racional é confessar. Essa lógica vai, dessa forma, proporcionar a ambos dois
anos na cadeia. Será que isso é realmente "racional" quando, se ambos ficassem
calados ("cooperação"), cada um poderia pegar apenas um ano? No geral, a
cooperação mútua é o melhor, já que a quantidade total de tempo que ambos pegariam
seria de dois anos em vez de três ou quatro.
Então, você deve cooperar, certo? Bem, suponhamos que o seu parceiro não chegue a essa
conclusão, ou que ele chegue, mas decida se aproveitar de sua confiança, defectando.
Neste caso, você terá que encarar o pior resultado possível: três anos vendo o sol
nascer quadrado. O que vai ser: você confia nele ou não? O que é mais racional,
cooperação ou defecção?
Esse problema e outros similares são provenientes da teoria do jogo, uma invenção do
matemático John
von Neumann (1903-1957). Von Neumann, um prodigioso húngaro que se estabeleceu nos
EUA, ajudou a desenvolver a bomba-A e, entre outras realizações, inventou o computador
digital. Ele também amava os jogos de estratégia, especialmente pôquer e xadrez, e lá
pelos anos de 1920 e 1930, desenvolveu uma teoria matemática para descrever suas
estruturas. Von Neumann fez isso, de certo modo, para melhor entender os jogos, mas
principalmente porque acreditava que a teoria do jogo poderia prover uma base científica
para o estudo de situações similares em outros campos. Ele cunhou o termo "teoria
do jogo" em The Theory of Games and Economic Behavior (1944, com Oskar Morgenstern).
O comportamento econômico é um "jogo", no sentido mais amplo dado por Neumann:
uma situação definida por interesses competitivos, em que cada um procura maximizar seus
ganhos.
A teoria do jogo foi um fracasso para os economistas, mas terminou sendo útil para outras
áreas. Depois da Segunda Guerra, Neumann foi contratado pela Rand Corporation, onde
aplicou a teoria do jogo mais produtivamente na estratégia da Guerra Fria. Recue no tempo
até os anos cinqüenta e imagine-se tendo que decidir se os Estados Unidos deveriam
construir um arsenal de bombas-H. Vamos supor que a União Soviética, o
"inimigo", seja perfeitamente capaz de fazer o mesmo. Suas possíveis escolhas
são duas: construir o arsenal ou não construir. Existem quatro resultados possíveis:
- 1. Nem os EUA nem a URSS constroem um arsenal
o status quo é preservado.
Se você analisar esse "jogo", vai
constatar que é um tipo de dilema do prisioneiro. Não importa o que a URSS faça, a
melhor vantagem para os EUA é construir bombas. (Se ela não o fizer, os EUA se tornarão
o poder mundial supremo; se ela o fizer, os EUA, pelo menos, ficam empatados com ela.)
Mas, se os soviéticos chegarem à mesma conclusão, ambos irão gastar toneladas de
dinheiro só para manter o equilíbrio de poder, enquanto acumulam estoques de
matéria-prima radioativa. O resultado ideal seria a "cooperação": cada lado
se refrear (possibilidade I). Mas você confia no outro lado? No final, nenhum dos dois
confiou.
Embora von Neumann tenha iniciado a teoria do jogo na RAND, não foi ele quem descobriu o
dilema do prisioneiro nem foi ele quem estudou suas implicações. Von Neumann
concentrou-se quase que exclusivamente no que chamou de "jogos de tudo-ou-nada".
Nestes jogos, o total da remuneração é fixo, e o que um adversário ganha é
necessariamente o que o outro perde. A maioria dos jogos de mesa, por exemplo, são
tudo-ou-nada: se o seu adversário vence, você perde. O pôquer também é um
tudo-ou-nada: o vencedor leva tudo.
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