A Torneira Aberta
 
Preguiçosamente escorro
dum parto de mãos mundanas
eu, filha de mãos divinas.
Salpico de vida o que brota aqui
e ali chovo as tragédias
das esperanças de outrora.
No teu banho enxugo tuas lágrimas,
embebedo teu sorriso, que não faz mais
nascer árvore, nem amor,
nem pudor.
Contaminada pela tua providência
a mergulhar em mim,
enlodo a vida que te permeia,
espirro para todos as cores impuras,
a antiga transparência
agora, tão láctea...
ao chegar à tua mesa.
Deixo de molho tua roupa,
purifico teus cansados odores,
enxáguo tua mal levada vida
encharco teus sonhos,
chovo nos teus planos.
Pingo à tua vontade,
perfeita na moderação,
trágica na saudade,
pois tuas mãos obstetras,
meu filho e pai, a mim dão de comer.
regolfo sempre.
Sem tua sede, não resisto:
gotejo desesperadamente.
Nadar de volta ao lago,
ao rio, ao mar não posso.
Só aforgar-me no teu corpo,
Nesse balde que irriga vida
nas veias, na ânsia de voltar
à ela, à mesma que, diariamente,
escoa pelo ralo,
indiferente.
 
Maria de S.José T. Dias
May/98
 
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Updated / Atualizado em: 02-Jan-99
 
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